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quinta-feira, 26 de maio de 2011

 EMAIL

Recebemos esse email do jornalista Daniel Dantas, é extenso, mas vale a pena fazer essa leitura.

Disse-lhe, pois, o Senhor: "As acusações contra Sodoma e Gomorra são tantas e o seu pecado é tão grave que descerei para ver se o que eles têm feito corresponde ao que tenho ouvido. Se não, eu saberei

Há toda uma geração de seres humanos identificados como cristãos que gostam muito desses capítulos do livro do Gênesis (18 e 19).  Os textos relatam a destruição de Sodoma e Gomorra.

Tradicionalmente a destruição das duas cidades é atribuida a um pecado que, não por acaso, ficou conhecido como sodomia.  No capítulo 19, todos os homens da cidade cercam a casa de Ló para violentar os três anjos que foram à cidade.  Por isso, identifica-se a causa da destruição da cidade com a homossexualidade.

Tais pessoas certamente têm um déficit de letramento sobre o qual não são tão intensamente culpados, mas falo já sobre isso. Primeiro devo dizer que vejo uma legião de cristãos que adorariam lançar fogo e enxofre sobre a cabeça de homossexuais assim como, segundo o relato do Gênesis, Deus o fez sobre Sodoma e Gomorra.  

Hoje eu vi essa fatia que se identifica como povo de Deus se refestelar.  Era como se fogo e enxofre tivessem queimado os gays da nação - que eles juram amar e respeitat, mas vivem estimulando toda sorte de violência contra eles, como no episódio em questão.

Envergonho-me de ser identificado como evangélico ao lado de gente como Silas Malafaia e Marco Feliciano.  A cantora Fernanda Brum tuitou hoje que a decisão da presidenta Dilma de suspender a distribuição do kit anti-homofobia foi uma resposta de Deus à oração.  

Com Deus não se brinca, irmãos, como vocês mesmos costumam dizer: o que aconteceu hoje foi fruto da chantagem que mais uma vez violentou os direitos dos outros.  Se chantagem já é uma prática condenável - um pecado, no linguajar religioso -, ainda mais pecaminoso é afirmar que a chantagem resultou da resposta de Deus à oração.  Com Deus não se brinca.

Os que agem como que quisessem queimar os gays têm um sério déficit de letramento.  Podemos e devemos colocar esse texto junto a outro (Lc 9. 52 – 56):

E enviou mensageiros à sua frente. Indo estes, entraram num povoado samaritano para lhe fazer os preparativos mas o povo dali não o recebeu porque se notava em seu semblante que ele ia para Jerusalém.

Ao verem isso, os discípulos Tiago e João perguntaram: "Senhor, queres que façamos cair fogo do céu para destruí-los?”

Mas Jesus, voltando-se, os repreendeu, dizendo: "Vocês não sabem de que espécie de espírito são, pois o Filho do homem não veio para destruir a vida dos homens, mas para salvá-los e foram para outro povoado.

O episódio de Sodoma e Gomorra tem esse paralelo no Novo Testamento. E Jesus muda a história.  Jesus não veio para destruir mas salvar.  Os cristãos evangélicos que se refestelaram hoje não devem ter esses versículos em suas Bíblias.

Mas para mim há um problema exegético e hermenêutico ainda mais grave.  Desafio a qualquer leitor a encontrar referência em Gênesis 18 e 19 de que o pecado que condenou Sodoma e Gomorra tenha algo a ver com homossexualidade.  Deus diz que o pecado das cidades já tinha superado o Seu limite.  Decide então descer para conhecer e julgar. 

Se os anjos tivessem aparência de mulher e o povo da cidade quisesse abusar sexualmente deles, a história não teria sido nada diferente.  A homossexualidade não está em destaque na questão.

Disse tudo isso para reiterar que me sinto envergonhado por ser cristão evangélico num dia em que um grupo político usando o meu nome chantageou o governo Dilma para, violentando novamente os direitos de uma minoria, fazer valer sua vontade política.  Mas do que meu nome, eles usaram o nome de Deus, atribuindo tudo isso ao poder da oração

Hoje o governo Dilma amarelou diante da chantagem dos religiosos.  Eu me arrependi do voto que dei em outubro.  Duas vezes.  E do tanto de tempo, dinheiro e energia eu investi naquela campanha. Não dei meu voto para que o governo abrisse mão dos avanços na cultura do governo Lula, para que aprovasse leis contra a floresta e para que não tivesse coragem de enfrentar as violências contra as minorias.

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