segunda-feira, 29 de setembro de 2025

TURISMO - Corais do Rio do Fogo estão entre mais afetados por onda de calor em 2024, diz estudo.


A onda de calor sem precedentes que atingiu os oceanos entre 2023 e 2024 deixou um rastro de destruição nos recifes de coral do Rio Grande do Norte. Um estudo pioneiro, que mapeou pela primeira vez os impactos de um evento global de branqueamento na costa brasileira, revelou uma dicotomia no estado: enquanto Rio do Fogo sofreu uma mortalidade de 38% de sua cobertura de corais, o Atol das Rocas, primeira reserva biológica marinha do Brasil, não registrou nenhuma morte, apesar do mesmo estresse térmico.

Os dados, publicados na revista científica Coral Reefs, são parte de um esforço que monitorou 18 ecossistemas recifais em todo o país. A pesquisa confirmou que o Nordeste foi a região mais castigada pelo aquecimento das águas. Rio do Fogo figurou entre os quatro pontos mais críticos de todo o levantamento, um indicador da gravidade do fenômeno no litoral potiguar.

O fenômeno, conhecido como branqueamento, ocorre quando o calor excessivo faz com que os corais expulsem as microalgas que vivem em seus tecidos e lhes fornecem nutrientes e cor. Sem elas, os corais tornam-se brancos e, se o estresse térmico persistir, morrem de inanição. Em média, os recifes brasileiros foram expostos a 88 dias de temperaturas acima do normal.

Em contraste com a mortalidade registrada no litoral, os dados das águas oceânicas do estado mostraram um cenário distinto. O Atol das Rocas, assim como o Arquipélago de Fernando de Noronha, foi um dos 11 locais monitorados no Brasil onde, apesar do potencial de branqueamento e mortalidade, não houve perda de cobertura coralínea. Os corais dessas áreas sobreviveram ao pico de calor, ocorrido entre abril e junho de 2024, e recuperaram suas zooxantelas quando a temperatura da água baixou.

Segundo os cientistas envolvidos, essa heterogeneidade de impactos, mesmo em locais geograficamente próximos, reflete a enorme variedade dos recifes brasileiros. Fatores como a diversidade de espécies, profundidade e a presença de ameaças locais podem influenciar a capacidade de um coral resistir ao aquecimento.

O estudo serve como um alerta severo. “É assustador, porque fica a sensação de que a gente está correndo contra o tempo”, afirmou a bióloga Giovanna Destri, do Instituto Oceanográfico da USP e uma das autoras principais do artigo. Para os pesquisadores, o que aconteceu no Nordeste é um prenúncio do que pode se tornar comum com o avanço das mudanças climáticas.
Nordeste foi epicentro da mortalidade de corais

Além dos impactos no Rio Grande do Norte, o estudo confirmou que o Nordeste como um todo foi o epicentro da devastação. Quatro pontos da costa nordestina registraram mortalidade em massa, com números expressivos para a comunidade científica.

O caso mais extremo ocorreu em Maragogi, no norte de Alagoas, onde o excesso de calor dizimou quase 90% (88%) da cobertura de corais, um colapso ecológico para a região. Em Pernambuco, os danos também foram severos: São José da Coroa Grande perdeu 53% de seus corais, enquanto a famosa Porto de Galinhas viu sua cobertura coralínea ser reduzida em 28%. Junto a Rio do Fogo (38%), essas localidades representam as cicatrizes mais profundas deixadas pela onda de calor de 2024.

O levantamento, liderado pelo Projeto Coral Vivo, foi o primeiro a avaliar de forma sistemática e padronizada os danos de um evento global de branqueamento em toda a costa nacional. A pesquisa revelou que o branqueamento afetou cerca de um terço (36%) de todas as áreas avaliadas no país.

Paradoxalmente, alguns dos locais com maior taxa de mortalidade, como Maragogi e São José da Coroa Grande, estão dentro da Área de Proteção Ambiental Costa dos Corais, o que demonstra que mesmo as unidades de conservação são vulneráveis aos efeitos do aquecimento global.

Os cientistas alertam que o episódio é um aviso do que pode acontecer em outros lugares do Brasil e do mundo nos próximos anos, à medida que os eventos climáticos extremos se tornam mais intensos e frequentes.

O trabalho teve participação de dezenas de pesquisadores, vinculados a 20 instituições – 15 universidades públicas brasileiras, entre elas a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, três ONGs brasileiras, uma agência federal brasileira e uma universidade francesa.

*Com informações do Jornal da USP

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